12 de jul. de 2009
O outro e as fronteiras
Fronteira entre México e EUA
Escrevi aqui no blog duas semanas atrás sobre a questão do outro. Uma das colocações que fiz, no post intitulado "Uma Beleza Sozinha Não Faz Verão", foi: se a minha beleza depende da do outro para existir, logo é a partir do respeito ao que é diferente de mim que serei respeitado!
O outro é a nossa fronteira, a nossa referência de finitude e, ao mesmo tempo, de complementaridade. O outro pode ser o nosso calibre, a válvula de ajuste da existência. Existimos porque o outro existe. Sem ele, não somos, não repercutimos. O outro e nós somos, ao mesmo tempo, um.
Tendo em vista esse ponto de vista, proponho aqui uma reflexão sobre o outro enquanto país, nação. E, por consequência, suas fronteiras que delimitam a liberdade do ir e vir, as trocas mercantis, os idiomas, as culturas.
Há hoje, na Europa, em comparação com a primeira metade do século XX, milhares de quilômetros de fronteiras internacionais a mais (procurei no Google a quantidade exata em quilômetros, mas não encontrei). O continente conta com 50 países atualmente, número quase duas vezes maior que há 50 anos.
Pergunto: o que explica esse fato, se levarmos em consideração que desde a Primeira Grande Guerra o processo de globalização é cada vez mais presente, haja vista a própria criação e a expansão da União Europeia nas últimas duas décadas?
Muro de Berlin
Onde há luz, sempre há sombra. Ou seja, tem sido através da tentativa de equalização (seja política, econômica, social) que, na Europa, as diferenças culturais pipocam e culminam numa reivindicação, quando não numa convulsão coletiva, pelos valores culturais de cada povo.
A diversidade só é (e assim deve ser) bela quando a possibilidade de comparação com o outro é possível. Num cenário em que se tenta colocar na mesma cesta uma série de diferentes nacionalidades, culturas e valores, é natural que o azul não queira se misturar com o vermelho, o amarelo, com o verde, e vice-versa.
Assim, quanto mais globalizados formos, menos as bandeiras haverão de se misturar. A manifestação de valores culturais de um povo está intrinsecamente ligada à sua capacidade de diferenciar-se.
Talvez resida aí um dos fatores que levaram por água abaixo a tentativa de implementação dos ideais marxistas na ex-União Soviética. É natural do ser humano sentir-se único (seja enquanto indivíduo ou grupo). E numa região de dimensões continentais como a ex-URSS é natural que as diferenças étnicas se tornariam fraturas expostas cedo ou tarde.
O caso da China, uma das exceções desse meu ponto de vista, ainda foge do meu entendimento. A população fica completamente sujeita às decisões do Estado Chinês, que controla até quantos filhos seus cidadãos podem ter durante toda sua vida. A não ser que haja, nas próximas duas décadas, uma mudança radical das bases do poder chinês (e, por consequência, a inclusão de valores mais democráticos na sociedade), não vejo a cristalização do atual ritmo de crescimento econômico que a China vem experimentando nos últimos 15 anos.
Outro exemplo de exceção é Cuba. Talvez, com o fim da dinastia Castro, que acredito acontecer até 2015, seja possível que os cubanos passem a integrar a dinâmica global de trocas mercantis, científicas e tecnológicas. Sobretudo agora com a boa vontade de Barack Obama.
Poderia citar outros exemplos aqui, mas continuaria penando para achar um ponto interessante para concluir este texto. O fato é que as fronteiras vêm aumentando, assim como o número de países, apesar de a globalização fazer força para emplacar.
O próprio episódio recente da gripe suína, ou melhor, gripe tipo A, deixou escancarado nos quatro cantos do mundo que, sim, estamos dispostos a fechar nossas fronteiras na iminência de riscos de contágio de doenças estrangeiras.
Aliás, a própria etimologia da palavra ‘estrangeiro’ já encerra em si o verdadeiro sentimento que cultivamos pelos povos que não os nossos: estranhos!
É claro que, em nome da saúde pública e blablablá, devemos pensar primeiro na gente, e não nos ‘estranhos’, quer dizer, nos estrangeiros. Mas ainda assim fico aqui matutando sobre para onde apontará a resultante desse movimento mundial de proteção fronteiriça.
Não quero nem imaginar um desfecho não muito bonito. Aliás, nada com nome de desfecho deve carregar muita beleza. Afinal, se o Universo é infinito, qualquer tentativa de se pôr um fim a qualquer coisa sempre cairá por água abaixo.
Fronteira entre Bélgica e Holanda: exemplo de convivência com o outro
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